COM TODO RESPEITO AO NOSSO “MALDITO BENDITO”
Se me perguntassem hoje o que é ser ator, eu responderia: Vá assistir Plinio, A história do Maldito Bendito, que depois a gente conversa! Daria um lenço, esperaria uns 3 dias para que a pessoa digerisse o que viu e ouviu, e aí, sim, começaríamos o nosso diálogo com a seguinte resposta-pergunta: Por que você quer ser ator? Acho que seríamos acometidos por uma expressiva pausa dramática ////
Digo
isso, porque Roberto Bomtempo está
nos presenteando com a possibilidade de conhecermos mais sobre o nosso teatro e
os nossos autores. Está mostrando também para o leigo, o dito “público comum”,
um pouco da árdua profissão do ator; e para os aspirantes que querem se aventurar
nessa carreira, a dura realidade.
O que temos
em PLÍNIO é a celebração de uma vida e obra dedicadas ao teatro. O espetáculo é
um recorte muito bem escrito por Mauricio
Arruda Mendonça, que soube extrair o que há de mais humano na vida de
Plínio, o que há de eterno na obra desse “maldito bendito”, o que há de
“clássico” na brutal denúncia de suas peças, que parece continuar inalterada até
hoje, e o que há de real no dia a dia dessa profissão de ator. A maneira como
Arruda conduz o seu texto, mesclando história, vida e arte transforma o
espetáculo numa verdadeira aula de teatro, desde a teoria à prática, graças a
excelente interpretação de Roberto Bomtempo.
A dramaturgia
do monólogo consegue inserir o espectador dentro do jogo através de uma
ferramenta “mística”, que Plínio Marcos conhecia muito bem, e usava para
sobreviver: o TARO! Ops! Mas Plínio não era escritor e ator? Sim, mas também
estava nas estatísticas dos 99,9% dos atores que não conseguem sobreviver do
seu trabalho. Além de tirar cartas de taro, Plinio também vendia seus livros
nos bares, nas ruas, nas portas dos teatros, ... outra ferramenta utilizada
para alavancar humanamente a dramaturgia e legitimar a triste miséria sofrida, mas
maldita bendita história de um ser humano que só queria trabalhar e que fora
sempre impedido pela censura. Para se ter uma ideia, sua peça Barrela, escrita em 1957, só pôde ser
encenada 21 anos depois, em 1978, que continuava atual, e, inclusive, até
hoje!!!
Mas
não só por esses motivos, que já são muitos, e que valem a ida ao Teatro
Gláucio Gill, o elemento principal dessa peça é, sem dúvida, a vida que Roberto Bomtempo dá ao seu personagem,
mostrando mais uma vez o grande ator que todos nós sabemos que ele é. Bomtempo,
com sua sensibilidade investe no caráter humano de Plínio. Na simplicidade de
sua narração ele nos revela o submundo daquele “camelô de histórias”. É nítido
o alto grau de comprometimento e paixão que o ator dispende ao contar essa
história e também o respeito e cuidado na palavra, para que não haja distorções
no sentido ideológico-político. O espetáculo, embora responda muito bem ao
atual momento político do Brasil, não se corrompe “panfletariamente”. O que
temos em cena é a honestidade de um excelente ator a serviço de seu ofício.
Palmas para você e palmas para o público que está conhecendo, através do seu
trabalho, o trabalho de um homem, que, no fundo, SÓ QUERIA TRABALHAR!!!
Completando
essa magia, está a sutil direção de Silvio
Guindane, que define essa peça como: “Este espetáculo fala sobre sonhos”. Acredito
que deva ser mesmo um sonho trabalhar com um autor dessa dilaceração impulsiva,
com um dramaturgo que soube captar a essência humana desse Plinio e com um ator
totalmente disponível e disposto a se jogar nesse picadeiro de emoções. Parabéns
pela ótima e generosa direção, que caminha junto, à serviço do coletivo, e que
não pretende se sobrepor, e, sim, contribuir com o espetáculo.
A
cenografia de Daniele Geammal, tem
uma qualidade “nua e crua”, seca e áspera que adjetiva o que foi a vida de Plínio
Marcos, além de dar forma ao “picadeiro”, que foi onde tudo começou para o
artista.
Em
sintonia com toda a atmosfera do espetáculo está a iluminação de Daniel Galvan e o figurino de Mel Akerman. O que vejo em cena é o
resultado de muita paixão, aliado com competentes profissionais que,
generosamente souberam respeitar essa grande homenagem, a esse grande homem de teatro
que foi PLÍNIO MARCOS!!!!
Parabéns
e vida longa ao espetáculo!!!